As ameaças ao Cepel com a potencial privatização da Eletrobras
Cepel é reconhecido pelas experiências em inovação no setor de energia e por ter contribuído para o modelo de operação do Sistema Interligado Nacional (SIN)
Com dezenas de laboratórios, o Centro de Pesquisa de Energia Elétrica (Cepel) é reconhecido como um dos responsáveis por permitir que o Sistema Interligado Nacional (SIN) permita a transferência de grandes blocos de energia entre regiões. Os softwares e modelos de operação foram desenvolvidos internamente e são uma das principais garantias de abastecimento do país – a dificuldade técnica era considerada ampla em função das dimensões do país.
Essa funcionalidade dá tranquilidade ao setor energético brasileiro e oferece proteção para se evitar problemas como o apagão que ocorreu no estado do Amapá, no fim do ano passado. Apesar de seu papel no desenvolvimento de soluções para o setor de energia desde a década de 1970, a possibilidade de privatização da Eletrobras se torna um risco para a continuidade de suas operações.
Corte de verbas
De acordo com a Medida Provisória 1.031/21, a Eletrobras manterá por mais quatro anos suas contribuições ao Cepel. No primeiro ano após a desestatização, a contribuição será equivalente ao que foi pago em 2020. A partir do segundo ano, será reduzida em 25%, conforme explica a Agência Senado.
Em 2019, de acordo com o relatório da instituição, o Cepel recebeu R$ 236,7 milhões, sendo 82% correspondente ao aporte de seus Associados Fundadores e o restante tem origem em outros investimentos, comercialização de produtos e projetos de P&D+I. No total, a Eletrobras responde por 41% dos custos, o equivalente a cerca de R$ 97 milhões. No total, a instituição contava com 506 colaboradores.
Em suas próprias palavras, a instituição afirma gerar valor “por meio da entrega de pesquisas e soluções que contribuem para o uso mais eficiente do capital aplicado na produção, na transmissão, na comercialização e na distribuição da energia, assim como no uso final dessa energia. Assim, o CEPEL gera valor para todo o setor elétrico brasileiro e, por extensão, para toda a sociedade”.
Iniciativas do Cepel
O Cepel teve participação importante na adoção do PLD Horário pelo Brasil. A instituição foi responsável por desenvolver o sistema aplicado pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), chamado de DESSEM. Para ilustrar outros benefícios que pode gerar, o Cepel se tornou parceiro de um projeto de armazenamento de energia associado à produção hidráulica e fotovoltaica, adotado em uma usina de Itumbiara (GO) pela Furnas, conforme divulgou em seu próprio site.
“O projeto de Furnas é particularmente interessante em função de implantar e analisar um sistema híbrido de armazenamento energético (hidrogênio e baterias) e em conexão à geração elétrica fotovoltaica em associação à própria UHE. Espera-se, assim, alcançar significativos resultados e conhecimentos acerca dos comportamentos, eficiências e integração dos equipamentos e dispositivos constituintes do projeto”, diz o pesquisador do Cepel José Geraldo de Melo Furtado, que atua na iniciativa.
Como sobreviver?
Em entrevista ao Valor, o diretor-geral do Cepel, Amilcar Guerreiro, afirmou ser possível caminhar para um modelo sem a participação da Eletrobras: “Mas não pode ser de uma hora para outra”, diz. “São quase 50 anos vivendo sob uma mesma estrutura de financiamento. Não sei se quatro anos são tempo suficiente para fazer essa transição”, acrescenta.
Guerreiro reconhece que, embora o Cepel possa vender produtos e serviços a instituições privadas, a funcionalidade da instituição é a busca de soluções e de pesquisas. Em nenhum lugar do mundo, um centro de pesquisas sobrevive apenas com a venda de produtos e de serviços. Até porque a inovação decorre também de falhas, do que não deu certo e do que aprendemos com as experiências”, diz.