Crise energética mundial expõe necessidade de discutir transição de matérias-primas
Situações vividas por Brasil, China e Reino Unido levam um alerta de dificuldades que precisam ser discutidas pelas principais nações do planeta para garantir segurança e confiabilidade do abastecimento
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As dificuldades vividas pelo Brasil em termos de abastecimento energético parecem ser apenas um pequeno capítulo de uma crise energética mundial que vem se desenhando. Um dos países com maior capacidade de produção de energia limpa, especialmente a hidráulica, o Brasil é, talvez, um indicativo das adversidades que devem aparecer ao longo de vários continentes nos próximos anos, com a sua crise hídrica obrigando na busca por outras soluções ambientalmente viáveis e acessíveis.
Recentemente, a China enfrentou uma série de apagões. Uma das orientações do governo chinês após os incidentes foi de “assegurar a qualquer custo reservas suficientes para garantir o fornecimento durante o inverno, após os apagões registrados recentemente”, conforme mostrou matéria da IstoÉ Dinheiro, baseada em informações da AFP.
As causas dos apagões se devem a uma soma de fatores: aumento da demanda de energia no exterior, preço recorde do carvão, controle estatal sobre o valor da energia e endurecimento das metas de emissões de poluentes.
A China é uma das grandes forças motoras do mundo em termos produtivos e de consumo. Com a possibilidade de uma dificuldade de abastecimento, há tendência de que a própria economia global seja sobrecarregada e patine em um momento de retomada pós-covid, conforme um alerta emitido pela Agência Internacional de Energia. A razão para isso se deve a diversos fatores, como o fato de os preços do petróleo e do gás natural terem atingido seus valores máximos em muitos anos.
Em um artigo publicado no site do Fórum Econômico Mundial, há uma preocupação em relação às consequências econômicas das dificuldades energéticas. “A energia é vital para quase todos os aspectos da vida moderna. Para manter indústrias funcionando, garantir o acesso à internet, aquecer e iluminar residências, manter o transporte funcionando, muito do que nós confiamos depende de energia. Quando o preço do gás ou da eletricidade sobe, os valores das outras coisas também vão aumentar”, diz o texto.
Uma transição complexa
Um dos fatores que gera preocupação é o fato de que muitos países estão tentando viver um período de transição dos modais energéticos, com o aumento das fontes renováveis, caso de solar e eólica. Entretanto, a situação brasileira leva a um sinal de alerta para muitos dos países que vivem este momento, já que as matrizes energéticas são muito distintas. Para o Fórum Econômico Mundial (WEF), esta situação pode levar a dificuldades nesta mudança de perspectiva.
Em todo o mundo, em 2018, apenas 14% da energia consumida era oriunda de fontes renováveis. No país, a média de uso desse tipo de modal estava em 45% — mais de três vezes o que se vê. Há uma série de fatores que precisam ser superados nesta mudança, mas um deles envolve a dificuldade para se desenvolver mecanismos que permitam o armazenamento de energia produzida de fontes renováveis. Além disso, a dependência de fatores incontroláveis, como a chuva, torna o processo mais complexo.
A escassez hídrica vivida pelo país mostra que é preciso investir neste tipo de modal, mas, ao mesmo tempo, encontrar caminhos para garantir a confiabilidade dos sistemas. Entre as possibilidades, estão a regulamentação de usinas híbridas e a possibilidade de retomar projetos nucleares muitas vezes impedidos por legislações estaduais.
Fatores a se considerar na crise energética mundial
Na avaliação do WEF, há algumas situações importantes a serem analisadas no atual momento de crise energética mundial:
– O aumento do valor das energias tradicionais, como carvão e petróleo, faz com que as energias renováveis sejam mais competitivas, já que, via de regra, são mais caras. E, como ocorre em todo o mundo, a disseminação do uso pode resultar em mais competitividade e preços menores, assim como evolução das tecnologias.
– Todas as nações têm um papel importante para que esse período de mudança seja o mais fluído possível. “A complexidade da transição energética é uma questão fundamental para a sociedade, com implicações em diversos setores e dimensões da vida”, diz Roberto Bocca, gerente da área voltada a moldar o futuro da energia do WEF. Segundo ele, não se trata de “vamos fazer melhor ou vamos ser mais eficientes”, mas, sim, uma mudança de compreensão sobre a forma como consumimos e produzimos energia.
– Novos modelos de negócios devem surgir a partir de novas matérias-primas ou fontes de energia. Eles precisam ser sistemas comerciais viáveis e compatíveis, de acordo com as necessidades. É muito provável que a cooperação entre empresas e nações contribua para que isso seja possível.
“A transição energética ao longo dos próximos 20 anos deve ser complexa, cara e – em muitos momentos – difícil para se implementar. Não devemos nos omitir deste desafio, mas trabalhar juntos para resolvê-lo”, afirma Bocca.
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