9/06/2020

As recomendações do TCU sobre a possível retomada de Angra 3

Crédito: Divulgação/PAC

Órgão quer transparência no processo e fez sugestões ao PPI e ao Ministério de Minas e Energia antes de seguir com a obra, que pode encarecer em 1,3% a conta de energia para o consumidor final

Uma estimativa da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) é de que a operação de Angra 3 no Sistema Interligado Nacional (SIN) encareceu em 1,3% a conta de energia. Em um momento no qual se discutem meios de reduzir o custo da energia como um todo, os comentários a respeito de uma usina cuja construção teve início na década de 1980 e poderia custar R$ 20 bilhões assusta. O Tribunal de Contas da União (TCU) se antecipou a uma possível retomada das obras e exigiu medidas por parte da Secretaria Especial do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) e ao Ministério de Minas e Energia (MME).

Enquanto o país vê o crescimento de seus parques eólicos e solares – energias renováveis –, Angra 3 segue como um dos esqueletos no armário que precisa ser resolvido. O ponto levantado pelo TCU é de que o consumidor não pode ser penalizado e que um dos caminhos para a retomada da usina nuclear seria a parceria com a iniciativa privada. Esse é, aliás, um dos desafios do setor elétrico: aumentar os níveis de investimentos e permitir a entrada de investidores estrangeiros.

De acordo com o TCU, a execução do empreendimento Angra 3 alcançou o avanço total de 62,8%. Foram executados 82,6% dos contratos de engenharia, 79,9% dos de suprimentos, 67,3% das obras civis e 10,8% da montagem eletromecânica.

Ao PPI, o TCU determinou que, antes de definir o preço da energia a ser gerada por Angra 3, realize avaliação independente das obras. “Especialmente quanto aos montantes de investimentos realizados, de investimentos previstos e dos custos de operação e de manutenção previstos para o empreendimento, expurgando eventuais ineficiências verificadas”, orientou o ministro-relator do processo na Corte de Contas, Walton Alencar Rodrigues. Em outubro de 2018, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) definiu que preço da energia seria de R$ 480 por megawatt/hora – frente aos 243 anteriores.

Para o MME, o TCU estabeleceu que, antes de formalizar a retomada das obras ou eventual parceria com a iniciativa privada, emita ato de outorga específico para a usina Angra 3. “Tal ato deverá ser compatível com a vida útil do empreendimento, que defina marcos temporais sobre a sua operação, aptos a possibilitar a fixação de multas pela Aneel, para eventuais atrasos na implantação”, esclareceu Rodrigues.

De acordo com o TCU, é preciso que o PPI faça consultas à sociedade e aos agentes do setor de energia para estabelecer uma posição definitiva sobre a retomada ou cancelamento da implantação de Angra 3, visando dar transparência ao processo.

Eletronuclear lança plano

A Eletronuclear lançou plano para acelerar as obras da usina no fim de maio. Mesmo com as dificuldades para encontrar parceiros internacionais ou de definir um modelo de negócios específico para Angra 3, o propósito da iniciativa é garantir que, em 2026, o empreendimento passe a gerar energia para o país.

Inicialmente, o valor disponível a ser colocado em Angra 3 chegaria a R$ 1 bilhão em 2020 — no entanto, este orçamento foi elaborado no período pré-pandemia e pode sofrer alterações, conforme a Eletronuclear. Chamado de Plano Diretor de Negócios e Gestão (PDNG), o projeto deve ser reavaliado ao longo dos próximos meses para que se possa readequar a quantia de recursos necessárias para a “aceleração crítica” da usina.

Dentro do PDGN, há a projeção de aportar R$ 1 bilhão em 2020; R$ 2,5 bilhões, em 2021; e R$ 3,4 bilhões em cada um dos três anos seguintes: 2022, 2023 e 2024. No período entre 2020 e 2024, o planejado anterior à disseminação da Covid-19 prevê R$ 32,3 bilhões em investimentos, sendo a maior parte para Angra 3 em 2021, 2022, 2023 e 2024.

Entre os principais riscos para esse plano sair do papel, encontra-se, é claro, a situação da pandemia — pois as consequências econômicas ainda são incertas — e possíveis atrasos ou insucessos operacionais de Angra 3.

No documento, a Eletrobras afirma que a apresentação do PDGN “tem por objetivo demonstrar aos senhores acionistas e mercado em geral, as estratégias e iniciativas que serão perseguidas pela Eletrobras, visando atingir as metas de seu PDNG 2020-2024. Entretanto, é importante destacar que esta apresentação contém certas estimativas. Tais estimativas não são declarações de fatos ocorridos no passado ou a serem realizados no futuro, mas refletem crenças e expectativas de nossa administração”.

Histórico

Projetada para gerar 1.405 MW – o que equivale a aproximadamente 0,9% da capacidade instalada do país –, Angra 3 teria grande potencial de contribuir no subsistema mais exigido do país: o Sudeste/Centro-Oeste – que, em momentos de estiagem, é impactado pela falta de água em reservatórios. A usina nuclear teve sua construção iniciada em 1980 e foi paralisada em 1984. Em 2007, a obra foi autorizada a seguir, com a coordenação da Eletrobras e da Eletronuclear.

Foi retomado a partir de 2009, com o aproveitamento de parte do projeto de Angra 2. Em 2015, contudo, a Operação Lava Jato identificou práticas de corrupção nos contratos da usina. “Houve formação de cartel e conluio entre os licitantes, o que foi claramente evidenciado, com base em confissão pública, por meio de acordo de leniência de uma das empresas integrantes do consórcio responsável pela execução”, explicou Rodrigues. Acompanhe outros temas do setor elétrico no blog da Solfus.

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